domingo, 18 de maio de 2014

JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA

ROUBO DE USO. TIPICIDADE RECONHECIDA. CP, ART. 157.

(DOC. LEGJUR 143.3335.2001.7900)

STJ - Recurso especial. Roubo circunstanciado pelo uso de arma de fogo. Delito complexo. Objetos jurídicos. Figura denominada «roubo de uso». Conduta tipificada no CP, art. 157 Brasileiro. Recurso especial provido.
«1. O crime de roubo é um delito complexo que possui como objeto jurídico tanto o patrimônio como também a integridade física e a liberdade do indivíduo. O CP, art. 157 exige para a caracterização do crime, que exista a subtração de coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa ou reduzindo à impossibilidade de resistência. 2. O ânimo de apossamento - elementar do crime de roubo - não implica, necessariamente, o aspecto de ...(Continua)
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COMENTÁRIOS:

Trata-se de decisão da 5ª Turma do STJ, relatada pela Minª. Laurita Vaz, julgada em 24/04/2014, DJ 08/05/2014 [Doc. LegJur 143.3335.2001.7900].
A controvérsia gira em torno de saber se o ordenamento jurídico pátrio reconhece a atipicidade do denominado «roubo de uso», isto é, quando o agente, mediante grave ameaça ou violência, subtrai coisa alheia para usá-la, sem intenção de tê-la como própria. A resposta da Corte foi no sentido de reconhecer a tipicidade da conduta.

Eis o que nos diz, no fundamental, a Ministra relatora:
"[...].

O art. 157 do Código Penal exige para a caracterização do crime, que exista a subtração de coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência.

A questão é controversa na doutrina e na jurisprudência, sendo que o entendimento aparentemente majoritário afasta a atipicidade da figura do roubo de uso. Entende-se que o "roubo de uso" não pode ser aceito já que a grave ameaça ou violência empregada para a realização do ato criminoso não se compatibilizam com a intenção de restituição, como bem explica Guilherme de Souza Nucci:
"O agente, para roubar - diferentemente do que ocorre com o furto - , é levado a usar violência ou grave ameaça contra a pessoa, de forma que a vítima tem imediata ciência da conduta e de que seu bem foi levado embora. Logo, ainda que possa não existir, por parte do agente, a intenção de ficar com a coisa definitivamente (ex; quer um carro somente para praticar um assalto, pretendendo devolvê-lo, por exemplo), consumou-se a infração penal." (in Manual de direito penal: parte gral; parte especial - 4.ª ed., RT, p. 700)
Por outro lado, há quem entenda que o elemento subjetivo do tipo requer o ânimo de apossamento definitivo, decorrente da elementar "para si ou para outrem". Ouso discordar.

Com a devida vênia dos entendimentos contrários, creio que o ânimo de apossamento – elementar do crime de roubo – não implica, necessariamente, o aspecto de definitividade. Ora, apossar-se de algo é ato de tomar posse, dominar ou assenhorar-se do bem subtraído, que pode trazer o intento de ter o bem para si, entregar para outrem ou apenas utilizá-lo por determinado período, como no caso em tela.

Compreende-se, portanto, que o ânimo de apossamento deve abarcar as diversas situações fáticas possíveis.

Caso contrário, como bem explica Hugo Nigro Mazzilli, todos os acusados do delito de roubo, após a prisão, poderiam afirmar que não pretendiam ter a posse definitiva dos bens subtraídos para tornar a conduta atípica. Nesse contexto, percebe-se o agente que utiliza da res furtiva por determinado período se insere na conduta tipificada no art. 157 do Código penal, como se observa dos seguintes ensinamentos:
"É o roubo de uso tão típico, tão antijurídico, tão culpável como qualquer outro roubo. Não importa a intenção de o agente subtrair para ficar ou subtrair para usar; em ambas há a criminosa subtração para si. O uso da coisa é um dos poderes inerentes à propriedade, da qual o agente se investe, cerceando indevidamente o direito patrimonial da vítima. a se admitir, para argumentar, que o roubo de uso não seria crime - a consumação de qualquer roubo deixaria de ocorrer no momento da subtração (v. ns. 12⁄14) para se protair estranhamente até o momento em que pudesse provar que a intenção do agente era de ficar definitivamente com a coisa. Na prática, quantos roubos não se consumariam; horas, dias, meses ou anos depois, poderia vir o assaltante a dizer que ia devolver a coisa, que somente a queira usar. A efetiva apropriação do bem pelo agente, o efetivo uso do mesmo, no caso do roubo, sequer são relevantes: mesmo que o crime pudesse não estar exaurido, estaria consumado como se viu nos incisos 12⁄14.
[...]

É muito comum, nos grandes centros, o roubo de automóvel para ser usado em outros assaltos e depois abandonado. Todos esses delitos seriam impuníveis em tese, a se admitir a figura do roubo de uso (que, diga-se, não tem vingado no foro paulista).

Ademais, no caso específico da subtração de veículos, há sempre o consumo do óleo e gasolina; há o desgaste das peças; há o abandono do mesmo em local fora da vigilância da vítima — tudo isso caracterizando um prejuízo patrimonial injusto e definitivo para a vítima.

A maior gravidade da ação do roubo, a maior temibilidade do agente, a maior reprovabilidade do comportamento, os interesses de defesa social — tudo desaconselha deixar de punir o roubo de uso, tudo desaconselha fazer do roubo de uso um crime privilegiado. Roubar para usar é tão criminoso como extorquir para usar, cometer latrocínio para usar a coisa." (in http:⁄⁄www.mazzilli.com.br⁄pages⁄artigos⁄obsroubo.pdf)
Conclui-se, portanto, que o direito penal brasileiro reconhece a figura do nominado “roubo de uso” como conduta típica, antijurídica e culpável, sendo agente incurso no art. 157 do Código Penal.
Ressalte-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal e esta Corte, no que se refere à consumação do crime de roubo, adotam a teoria da apprehensio, também denominada de amotio, segundo a qual considera-se consumado o delito no momento em que o agente obtém a posse da res furtiva, ainda que não seja mansa e pacífica e⁄ou haja perseguição policial, sendo prescindível que o objeto do crime saia da esfera de vigilância da vítima. ...» (Minª. Laurita Vaz).»
JURISPRUDÊNCIA DE QUALIDADE

Esta é uma jurisprudência de qualidade. Para o profissional do direito este julgado é uma fonte importante de subsídio, já para o estudante é muito mais relevante, justamente por dar vida ao direito, ou seja, aqui estão envolvidas pessoas reais, problemas reais que reclamam soluções reais. Vale a pena ler esta decisão. Ela está bem fundamentada pela Minª. Laurita Vaz. Tudo está exposto de forma didática, clara, fácil compreensão e de prazerosa leitura, como é de longa tradição do ministra relatora.

PENSE NISSO

Para o estudante de direito que tanto busca modelos de peças processuais, este acórdão é o melhor modelo que poderia consultar uma vez que retrata uma hipótese real, uma tese jurídica real, com pessoas reais, e uma decisão real, certa ou errada, e no fundamental contém o que realmente uma peça processual deve ter, ou seja, as partes, o relatório (fatos), a fundamentação, certa ou errada, e finalmente a parte dispositiva (pedido/decisão) (na forma do CPC, art. 282), enfim tudo que uma peça processual requer, independentemente se a peça é de natureza penal, administrativa, tributária, previdenciária, trabalhista ou extrajudicial. Quanto aos detalhes cada pessoa tem seu modo particular de redigir e o estudante com o tempo vai encontrar o seu modo de refletir sua identidade e personalidade nas peças processuais que subscrever e ao serviço que prestar.

Note-se, em geral quando um estudante ou um profissional busca um modelo de petição ou de uma peça jurídica, o que ele efetivamente deseja é uma tese jurídica que não consegue desenvolver, ou no mínimo tem dificuldade em fazer, ou ainda, falta-lhe condições materiais para tanto, neste sentido, a leitura sistemática de acórdãos adequadamente fundamentados é um instrumento muito importante para um estudioso possa ser capaz de desenvolver uma tese jurídica acerca de uma questão que lhe é posta e traduzi-la dentro de uma peça jurídica, isto significa qualificação profissional, e esta qualificação não nasce do nada, ao contrário requer considerável esforço intelectual, material, tempo, além da própria vocação.

Modelos não qualificam o profissional, na medida que negam a possibilidade deste profissional compreender em toda a extensão o que está fazendo, ou seja, impedem de sentir-se seguro. Pense, como alguém pode defender uma tese jurídica, quando não está seguro e tem dificuldade de navegar num universo de leis e ainda interpretá-las adequando-as à Constituição, elementos dos quais esta tese jurídica deve nascer?.

É fundamental consultar sempre, e com olhar interpretativo e crítico, a Constituição e as leis, na medida que vige no nosso sistema jurídico o princípio da legalidade, isto quer dizer, que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei (CF/88, art. 5º, II), e quando fala-se em virtude de lei, significa lei material avalizada pela Constituição, obviamente, Constituição desembarcada do lixo ideológico que a nega. Assim somente lei, em sentido material, avalizada pela Constituição, também em sentido material, pode criar direitos e obrigações. Não há tese jurídica sem aval legal e constitucional. Não há tese jurídica por ouvi dizer. Não há jurisdição por ouvir dizer ou por qualquer tipo de «achismo», ou seja, «... acho que» «... parece que» ou «... disse que», sem aval material da Constituição há apenas lixo ideológico. Assim só há peça jurídica se houver ali uma tese jurídica, materialmente válida, algo que modelos em geral não proporcionam, nem como ponto de partida.

Não há alternativa para a qualificação profissional. A qualificação profissional no Brasil, ao menos, na área jurídica, não pode ser comprada diante da falta absoluta de fornecedores habilitados. A qualificação é uma questão que está dentro de cada pessoa e da sua capacidade de obter este conhecimento por si só (autodidata) é o que prevalece sempre. A determinação em buscar este conhecimento também é relevante. Todo o conhecimento produzido pelo mundo está a disposição de qualquer pessoa, apreendê-lo é uma questão de vontade, convicção e vocação. Acredite, o «não saber» talvez seja a forma mais cruel de escravidão, na medida que disponibiliza a pessoa para uso, fruição e disposição de qualquer espertalhão, e eles existem em abundância e em geral não revelam nenhuma forma de respeito, consideração ou, mesmo piedade. Qualifique-se de verdade, como dito, ela não nasce do nada. Saber, conhecer, compreender é ser livre, ter alma, ter vida e ter sonhos. Pense muito nisso.

Há um mercado enorme e sem fim para quem está habilitado a prestar serviços jurídicos verdadeiros e por serviço jurídico deve ser entendido aquele que é útil e capaz de satisfazer as expectativas do consumidor e jurisdicionado. Não há prestação jurisdicional legítima e nem serviço jurídico legítimo sem o respeito incondicional as pessoas.

Nunca devemos esquecer que a litigância compulsiva e a prevaricação compulsiva de que tanto se fala, não é um serviço jurídico ou jurisdicional, é uma patologia, que apenas serve e beneficia governos despóticos e antidemocráticos, além de sedimentar e justificar a violência e o descrédito das instituições públicas e privadas perante a sociedade que deveriam servir.

Nunca deixe de ajudar o cliente. O advogado, como qualquer outro profissional responsável, é o suporte e o sustentáculo em que se apoiam as pessoas que o procuram e não o algoz delas. A confiança e o respeito não podem ser quebrados sem consequências. Não litigue. Trabalhe com confiança. Cobre honorários pelas consultas. Pense nisso e liberte-se.
FONTE: https://mail.google.com/mail/u/0/?tab=wm#inbox/14608c9b34d82254

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